Noções sobre a vinha e o vinho em Portugal
de Ceferino Carrera
Doenças e pragas da vinha
Tudo seria perfeito, num mundo vitícola feliz, se bastasse – independentemente dos caprichos da colheita – praticar uma boa viticultura para obter boas uvas e óptimos vinhos. Há, porém, temíveis inimigos que estão à espreita e que, se não forem combatidos, podem arruinar os pacientes esforços do viticultor.
São várias as doenças e pragas que afectam as vinhas causando estragos quando estas não são convenientemente tratadas.
Fungos
Míldio (Plasmora vitícola)
Doença que aparece em Portugal em 1881 (em França 1878). Esta doença é devida ao ataque de pequenas plantas (fungos) que não têm clorofila, necessitando viver à custa de outras plantas às quais sugam os alimentos já preparados.
Constitui a principal doença da videira, sendo a que actualmente mais estragos causa. Ataca todos os órgãos verdes e tenros da videira - folhas, pâmpanos, cachos até à altura de pintarem.
Primeiro sinal da doença - uma mancha de azeite nas folhas.
Míldio, uma vez instalado na videira, lança uns prolongamentos - Micélio - que se metem nos espaços intercelulares e sugam os sucos destas pelo que secam as partes atacadas.
Os efeitos do Míldio são muito mais nocivos do que aparentam no início do ataque, pois muitos estragos futuros são devidos à influência nefasta deste parasita que abre o campo a outros inimigos, como por exemplo, os bolores, que fazem apodrecer as uvas, e ao sol que as seca.
Os tratamentos devem fazer-se até que os bagos pintem, pois até essa ocasião estão sujeitos a contrais doença. Presentemente é a calda bordalesa (descoberta em 1885) a melhor forma de defesa contra o Míldio. Composição da calda bordalesa para 100 litros de água, 1 kg. de sulfato de cobre e 1 kg. de cal. Outros produtos, que se podem usar: oxi-cloreto de cobre, oxido cuproso, zinebe, captamo, etc.
O primeiro tratamento deve ser feito quando os pâmpanos têm cerca de 10 cm. Um outro antes da floração, um após o vingar dos frutos, mais dois quando os bagos têm já as dimensões dum grão de ervilha e um último 3 a 4 semanas depois dos anteriores. Todos estes tratamentos dependem essencialmente das condições atmosféricas ambientes.
Oídio ( Oídium-Tuckeri ou Uncinue Necator)
Doença que aparece em Portugal em 1862 (em França 1850). Esta doença é devida a um fungo que causa em alguns anos estragos comparáveis ao Míldio. O Oídio ataca sobretudo os cachos, mas também aparece nas folhas e nos Pâmpanos novos.
Deve responsabilizar-se não só pelos estragos que directamente causa, como também pelo caminho que abre a outros parasitas que, como bolores, atacam o bago depois de rachado, apodrecendo. É designado vulgarmente por cinzeiro, poeira e pó.
Sobre a folha começa por se notar uma ligeira perda de cor que se verifica apenas quando se vê através da luz, como uns pontinhos escuros, cobrindo-se de uma enfeltrada que parece uma teia de aranha (micélio do fungo). Toma depois o aspecto pulverulento, de que lhe vem o nome (poeira, pó). Ataca as folhas tornando-as coriáceas e acabam por cair. Como também o cacho é atacado - manifesta-se pelo aparecimento de pó branco sujo, que pouco a pouco vai escurecendo, espalhando-se abundantemente.
Quando os bagos são pequenos e completamente atacados caem secos. Outras vezes racham, deixando as grainhas a descoberto. As vezes, quando a fenda não é funda, torna a cicatrizar desde que se faça parar a evolução do parasita. Os bagos atingidos ficam pequenos e duros, não amadurecem, dando, consequentemente, vinhos de fraca qualidade.
O Míldio distingue-se bem do Oídio. O Oídio é um parasita superficial que não penetra para o interior do órgão que ataca, como o Míldio. É por consequência, curável, enquanto que o Míldio não.
Enquanto que a mancha de azeite do Míldio se vê dos dois lados das folhas, a do Oídio, pelo menos a princípio, só se vê do lado atacado, geralmente o lado inferior, tendo o aspecto de feltro branco sujo e depois cinzento, cheirando a mofo. As manchas de Míldio são translúcidas, ao passo que as de Oídio notam-se com dificuldade contra a luz.
De entre os meios de luta contra o Oídio usa-se o enxofre e os seus derivados. Nos tratamentos preventivos é aconselhável o primeiro tratamento ser feito na altura da floração, o 2º cerca de duas semanas depois do vingar dos frutos e o 3º um mês depois dos anteriores. Todos estes tratamentos dependem do decorrer da estação atendendo especialmente às variações de temperatura. Os tratamentos curativos efectuam-se logo que se dê o aparecimento da doença. Por vezes efectua-se tratamentos mistos contra o Míldio e o Oídio, incorporando o enxofre na calda bordalesa. Além do enxofre vulgar podem também empregar-se enxofres molháveis e o Dinocape.
Fumagina (Capnodium Salicinum)
A fumagina ou ferrugem pode atingir os cachos, as folhas, os sarmentos e os troncos podendo levar ao definhamento das cepas devido à redução da assimilação clorofilina e transpiração das folhas. Raramente aparece isoladamente, estando sempre os seus ataques associados aos do algodão. Os ataques são mais acentuados nas zonas húmidas, sombrias e pouco arejadas.
Os tratamentos fazem-se com insecticidas tais como o Malatião, Carbonil, Lindano, etc.
Insectos
Algodão (Pseudococcus citri)
A sua acção vai-se fazendo sentir a pouco e pouco, originando o definhamento das cepas porque lhe absorve a seiva; provoca o aparecimento da ferrugem e atrai as formigas. Surgem formações esbranquiçadas lembrando flocos de algodão que protegem o insecto. Aparece nas folhas, especialmente na axila, nas varas já velhas e no cacho. Os bagos não atingem então a maturação completa ficando com sabor desagradável.
O seu combate é difícil porque se desenvolve numa fase em que o ataque se torna mais dispendioso e de efeitos mais contingentes, utilizando-se contudo o Malatião, Carbonil e Lindano.
Filoxera (Phulloxera Vastatrix)
Praga que aparece em Portugal em 1872, procedente da América do Norte, segundo se julga. Insecto quase invisível a olho nu, estabelece-se nas raízes da cepa, picando-as com a tromba - chupadoura para se alimentar com o seu suco - fazendo com que esta fique mole e apodreça.
As cepas que circundam o primeiro foco de infecção debilitam-se, amarelecem progressivamente até que, por fim, são completamente dessecadas. Quando a parte atacada tem uma certa extensão e quando a doença está suficientemente intensa, em vez de um centro de ataque, encontram-se diversos desses centros. Observa-se, ao mesmo tempo, que a filoxera, autora dessas graves desordens, não se demora nunca sobre as raízes que começam a decompor-se. Desde que um determinado ponto apodrece, transfere-se imediatamente para outro. Numa palavra, produz a podridão procede-a sem desfalecimento, porém, nunca a acompanha. Até hoje nenhuma das castas das nossas vinhas - algumas delas bastante ricas - têm sido poupadas por esta terrível: praga da Vinha.
Maneira de combater esta praga: a aplicação dos insecticidas tem sido tentada com tenacidade. Nenhum deles, porém, tem conseguido alcançar completos resultados. Os melhores resultados têm sido conseguidos com a plantação da vinha em terrenos arenosos e terrenos não arenosos mas inundados de água durante os meses de Outubro e Novembro; ou então, plantar bacelos americanos e depois enxertá-los com as nossas especializadas castas (Vitis - Vinifera).