«CANÇÕES DE BEBER» DE FERNANDO PESSOA
"Vivemos nas encostas do abandono / Sem verdade, sem dúvida nem dono / Boa é a vida, mas melhor é o vinho. / O Amor é bom, mas é melhor o sono.» Com pinturas de Eurico Gonçalves. - "Ao gozo segue a dor, e o gozo a esta. Ora o vinho bebemos porque é festa, Ora o vinho bebemos porque há dor. Mas de um e de outro vinho nada resta". Afogam-se mágoas, mergulham-se dores, partilham-se alegrias, deixam-se as tristezas submersas, afundam-se amores nas bebidas tomadas nos cafés e nas tabernas de Lisboa ao fim da tarde, no começo do século XX. Sente-se a melancolia de Pessoa nestes seus rubaiyat, inspirados em Omar Khayyam (um matemático, filósofo e astrónomo persa que viveu entre 1048 e 1142 e fundou os rubiyat) e nos quais se observa o seu trabalho extraordinário na língua portuguesa, através do uso de formas métricas não habituais. Segundo Maria Aliete Galhoz, no prefácio a este livro, "A forma poética do rubaiyat encerra uma métrica especial quantitativa, desconhecida na poesia árabe. O quarteto mede-se com a quantidade de sílabas (?) e não com o quantitativo de sílabas curtas e longas (...). Ainda hoje na poesia popular dos povos iranianos se usa o rubai". Esperemos que aprecie as amarguras do poeta, sempre insatisfeito com a vida, agora reveladas nestas Canções de beber: "Cada dia me traz que sperar/ O que dia nenhum poderá dar./ Cada dia me cansa da eserança?/ mas viver é esperar se cansar".